Dept. Q: O Fenômeno que Transformou Casos Frios em Ouro da Netflix
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Quando Dept. Q estreou na Netflix em maio de 2025, trouxe consigo uma notável bagagem cultural: nascida da aclamada série literária de Jussi Adler-Olsen (11 livros publicados entre 2007 e 2021), essa história já havia gerado seis filmes dinamarqueses entre 2013 e 2021, estrelados por Nikolaj Lie Kaas como o detetive Carl Mørck. Sob a batuta de Scott Frank (criador de O Gambito da Rainha), a adaptação transcende suas origens. Transportada de Copenhague para o ambiente gótico de Edimburgo, a produção ganha novas camadas de profundidade psicológica e atmosfera palpável.
Acompanhamos Carl Morck (Matthew Goode), um investigador brilhante mas autodestrutivo, rebaixado aos porões da polícia escocesa após uma tragédia profissional. No recém-criado Departamento Q – uma saída burocrática para acomodar o detetive – ele comanda uma equipe de desajustados: o astuto assistente Akram Salim (Alexej Manvelov) com seu passado enigmático, a obstinada estagiária Rose Dickson (Leah Byrne), e o fantasma do desaparecimento de uma promotora que se torna o caso central da temporada.
Matthew Goode redefine o protagonista, afastando-se de seus papéis aristocráticos para criar um anti-herói “cascudo e emocional sem sentimentalismo”, como definiu Frank. Manvelov e Byrne brilham como contrapontos vitais – ele com ironia cortante, ela com persistência investigativa – estabelecendo uma química que evoca o melhor do gênero policial, mas com nuances únicas de redenção coletiva.
As diferenças em relação às adaptações anteriores são significativas. Enquanto os filmes dinamarqueses mantinham o cenário nórdico e personagens mais convencionais, a série nos entrega um Akram Salim multifacetado e transforma a névoa medieval de Edimburgo em personagem. O tom também se aprofunda: substitui o thriller policial tradicional por um drama psicológico com nuances de horror gótico, onde closes claustrofóbicos e paisagens escocesas amplificam a tensão. Até a fonte literária ganha reinterpretações criativas, mantendo porém a essência crítica ao sistema.
Embora brilhante, a série não é imune a falhas. O ritmo varia entre episódios mais curtos e longos, e algumas subtramas políticas nem sempre se integram perfeitamente. O arquétipo do “detetive atormentado” persiste, ainda que revitalizado pela atuação de Goode. Mas os acertos predominam: a fotografia transforma Edimburgo num noir vivo, e o desfecho da temporada abre portas para futuras investigações baseadas nos livros restantes de Adler-Olsen.
Com 85% de avaliações positivas no IMDb e elogios de fãs dinamarqueses que a consideram “superior aos filmes”, Dept. Q prova que grandes histórias podem renascer em novos contextos. Mais que adaptação, é uma reinvenção que preserva o núcleo essencial do material original: a crítica institucional, os fantasmas pessoais e a frágil resistência humana. Um convite para adentrar as catacumbas onde casos esquecidos guardam verdades incômodas.
Adriana Maraviglia
@revistaeletricidade
Assista ao trailer de “Dept. Q”: