“Vencer ou Morrer”: Beleza visual a serviço de um revisionismo perigoso  

Vencer ou Morrer – foto: Divulgação

Estreando no Brasil em 5 de junho de 2025, “Vencer ou Morrer” seduz com uma fotografia grandiosa e produção impecável, mas sua operação revisionista é tão perigosa quanto sofisticada. O filme transforma o líder contrarrevolucionário francês François de Charette (Hugo Becker) em mártir moderno, ignorando seu projeto político real: a restauração do Antigo Regime, com seu absolutismo, privilégios aristocráticos e supressão de direitos conquistados em 1789. A escolha de uma direção dupla (Pascal Elbé e Laurent Bourgeon) e a origem do roteiro revelam as engrenagens dessa distorção. 

Mergulhando com gosto em uma romantização enganosa do passado, o roteiro baseia-se no livro Charette: O Leão do Vendée (2019) do historiador de direita Jean-Joël Brégeon, conhecido por reinterpretar as guerras da Vendeia como um “genocídio republicano”. 

Charette (Hugo Becker), que é apresentado aqui como uma espécie de paladino da liberdade quando tinha a intenção de restaurar a monarquia absoluta, revogar direitos conquistados na Revolução Francesa e preservar privilégios aristocráticos em uma distorção grosseira que tenta transformar um defensor do Antigo Regime em um mártir progressista.

Para piorar, tudo é apresentado como um conflito religioso, colocando a revolta de Vendeia como um enfrentamento entre o bem (nobres católicos conservadores) contra o mal (republicanos sem religião). 

Apesar dos méritos técnicos – figurinos impecáveis, cenas de batalha vibrantes –, a produção usa sua beleza estética para vender uma falácia perigosa: a ideia de que a solução para nossos dilemas modernos estaria num passado idealizado que nunca existiu.

Em um momento em que mais uma vez estas forças de retrocesso se levantam ao redor do mundo, parece surreal existir  um projeto que pretende dar ares heroicos a uma luta indefensável. 

Quando Charette grita “Vencer ou Morrer!” – lema de exércitos espartanos e cartagineses –, o filme celebra um fundamentalismo que o direito humanitário moderno rejeita: a noção de que fins políticos justificam qualquer meio. Ao ressuscitar essa lógica em pleno 2025, a obra não comete apenas um erro histórico: oferece um manual estético para autoritarismos. 

Adriana Maraviglia
@revistaeletricidade

Assista ao trailer de “Vencer ou Morrer”:

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