“Meu Ano em Oxford”: Sofia Carson e poesia em novo romance da Netflix
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A chegada de Meu Ano em Oxford à Netflix transcende o rótulo de simples romance juvenil. É um gesto delicado, um convite ao desarmamento emocional disfarçado sob paisagens acadêmicas e encontros fortuitos. Sofia Carson, consagrada como força criativa dos romances contemporâneos, entrega não apenas um desempenho, mas uma declaração de maturidade artística. Como Anna De La Vega — a nova-iorquina pragmática que adia um cargo cobiçado no mundo financeiro para estudar poesia vitoriana em Oxford — Carson navega entre a leveza do humor e as sombras da vulnerabilidade com rara serenidade.
A cidade universitária de Oxford emerge como força vital, muito além de mero cenário. Filmada em locações reais, desde a imponente Biblioteca Bodleian até os pátios históricos, ela respira história e contradição: tradição versus rebeldia juvenil, rigor acadêmico versus irreverência existencial. A fotografia captura névoas matinais sobre pedras seculares, bibliotecas que são o material do sonho de todo fã de literatura e festas onde o caos reina. Este ambiente ecoa perfeitamente a jornada de Anna, sua transição do planejamento obsessivo para uma filosofia do agora, encapsulada na citação de Emily Dickinson que guarda no celular — “o para sempre é composto de agora“.
A química entre Sofia Carson e Corey Mylchreest evita clichês fáceis. Não se limita a momentos românticos convencionais; manifesta-se no espelhamento de suas vulnerabilidades. Ele, o intelectual sarcástico carregando um peso invisível; ela, a estrategista da vida confrontada com o imprevisível. O diretor Iain Morris, em sua estreia em longas dramáticos, subverte expectativas, dando aos relacionamentos e às dinâmicas entre os personagens camadas de humanidade que fogem de caricaturas.
O roteiro é baseado no livro My Oxford Year (2018), da norte-americana Julia Whelan, celebrada como uma voz marcante no universo literário. A adaptação, porém, traça seu próprio caminho. Enquanto o livro apresenta uma protagonista com raízes e trajetória distintas — uma bolsista de Ohio envolvida em política educacional —, o filme nos dá Anna, a nova-iorquina com um futuro financeiro promissor. As diferenças se estendem ao contexto familiar e, especialmente, ao tom do desfecho, onde o filme opta por uma conclusão mais definida e poética, contrastando com a ambiguidade melancólica que a obra original oferece.
No cerne da narrativa, pulsa uma crítica sutil ao pragmatismo moderno. Anna aprende que “viver deliberadamente”, ecoando Thoreau, não é sobre listas de conquistas, mas sobre “sugar o tutano da vida, mesmo que isso a deixe bagunçada”. Sua transformação se revela em gestos mínimos e significativos: um bolo compartilhado, a coragem de reescrever planos, a aceitação de que alguns encontros são estações, não destinos. Sofia Carson, também produtora, enfatiza que a história fala sobre “vida após o amor e vida após a perda“, mas sem reduzi-la apenas à dor.
Meu Ano em Oxford não é imune a falhas. Diálogos ocasionalmente previsíveis e subtramas que poderiam ser mais exploradas desafiam seu ritmo. Contudo, esses deslizes não eclipsam seu brilho essencial. É um romance que entende profundamente que o amor mais comovente não é aquele que promete eternidade, mas o que ensina a transformar perdas em legado. Anna descobre como honrar o que foi vivido sem se perder nele. Ao final, restam versos rabiscados na pressa de quem compreendeu que a vida não espera. E como Carson define: “É melhor ter amado…”. O filme prova, com delicadeza, que sim — cada lágrima carrega dentro de si a semente da resiliência.
Adriana Maraviglia
@revistaeletricidade